Golpe baixo, dona Netflix.

A revista Entertainment Weekly confirmou que David Benioff e Dan Weiss acabaram de assinar um grande contrato de nove dígitos (coisa próxima de 200 milhões de dólares) com o serviço de streaming Netflix, onde eles vão criar novas séries e filmes. A CNBC ainda afirma que o custo ao longo do tempo pode aumentar ainda mais. Ainda bem que eles se livraram de todas essas séries com mulheres diretoras, criadoras e elencos diversos , não é mesmo? (Sim, foram oito no total até agora: Tuca e Bertie, The OA, Friends From CollegeOne Day at a TimeJessica JonesOrange Is the New BlackChambers, e Gatunas)

Este é um acordo exclusivo de vários anos, então meus pêsames pra Warner, Amazon e Disney, que não vão conseguir esses gênios do fracasso pós-Game of Thrones na equipe deles. Com uma pequena ressalva pra Disney, já que ela ainda tem o super-secreto projeto Benioff/Weiss pra Star Wars a caminho, porque eu tenho certeza que é isso que o fandom de Star Wars precisa – mais reviravoltas só por ter reviravoltas. E eu digo isso como alguém que gostou de Os Últimos Jedi.

Ted Sarandos, diretor de conteúdo da Netflix, disse o seguinte em um comunicado:

Estamos muito contentes em receber os principais contadores de histórias David Benioff e Dan Weiss na Netflix. Eles são uma força criativa e encantaram o público em todo o mundo com sua narrativa épica. Não podemos esperar para ver o que a imaginação deles trará para nossos membros.

Sim, mal posso esperar para ver como eles imaginariam ter seu personagem principal em uma reunião sobre uma perigosa frota de navios e depois esquecer a frota na cena seguinte, levando à morte de uma de suas criaturas mais poderosas.

Benioff e Weiss divulgaram esta declaração:

Tivemos uma bela parceria com a HBO por mais de uma década e somos gratos a todos por sempre fazer com que nos sintamos em casa. Nos últimos meses, passamos muitas horas conversando com Cindy Holland e Peter Friedlander, assim como Ted Sarandos e Scott Stuber. Nós nos lembramos das mesmas cenas dos mesmos filmes dos anos 1980; nós amamos os mesmos livros; estamos empolgados com as mesmas possibilidades de contar histórias. A Netflix criou algo surpreendente e sem precedentes, e estamos honrados que eles nos convidaram para participar.

Outros projetos que esses dois tinham em andamento eram: um drama sobre prisão, baseado num livro intitulado Dirty White Boys; e uma série de drama, Confederate, que já foi cancelada por causa do acordo com a Netflix.

Sim, eu sei que o Game of Thrones acabou há meses, mas estamos  (eu e uma boa parte do fandom de GOT que odiou o final da série) inevitavelmente irritados porque Benioff e Weiss não parecem entender os motivos das pessoas chateadas com o final. Eles precisavam aceitar todas as críticas, especialmente de fãs dos livros como eu? Não, mas eles deveriam respeitar os fãs que foram leais desde o começo. Eu não vou dizer que Benioff e Weiss não fizeram um ótimo trabalho na série, mas você não pode receber todos os elogios e nenhuma das críticas.

A amargura só aumenta quando a contratação deles é feita num momento como este. O mundo precisa de mais mulheres desenvolvendo séries, e as poucas que conseguem sucesso são derrubadas em prol de diretores que acabaram estereotipando suas personagens femininas.

Nós já falamos bastante sobre isso aqui no site. Falamos sobre a Dany, sobre a reação dos atores com o final da série, sobre como GOT errou na representação de suas personagens femininas, aqui, aqui e aqui.

E o problema é que cancelamentos de série não são novidade, mesmo que todos nós sentimos a dor de perder uma série amada para os caprichos cruéis dos deuses da televisão. Mas esses cancelamentos geralmente não surpreenderam: com ferramentas como a Nielsen Ratings disponíveis em todos os lugares, você pode acompanhar instantaneamente a audiência de uma série e fazer previsões sobre o que ficaria e o que seria cancelado.

Mas o mundo do streaming é uma coisa diferente, já que a Netflix mantém seus números de audiência um segredo bem guardado, raramente compartilhando os dados, a menos que eles estejam comemorando o enorme sucesso de uma série ou filme. Isso pode levar a confusão de fãs e clamor, especialmente para séries aclamadas pela crítica ou séries com uma base de fãs dedicada.

Esses cancelamentos tornam-se duplamente frustrantes para séries inclusivas como ODAAT ou The Get Down, de Baz Luhrmann, que apresentaram elencos diversificados e receberam críticas muito boas no Rotten Tomatoes.

Enquanto a Netflix se orgulha em suas redes sociais de sua plataforma diversificada, o cancelamento de suas séries mais diversas, sem dúvida, envia uma mensagem duvidosa.

Mas qual é a culpa desses cancelamentos então? Há uma multiplicidade de fatores em jogo aqui, não menos do que a estrutura financeira da Netflix. A plataforma gigante de streaming investiu US$12 bilhões em conteúdo em 2018 e está a caminho de subir para US$15 bilhões este ano. Porém, enquanto eles estão gastando mais dinheiro, eles também estão reduzindo projetos e limitando muitas séries a 2 e 3 temporadas.

A Netflix passou seus primeiros anos se estabelecendo como uma peça importante na televisão e, graças a séries como House of Cards, Orange is the New Black e Stranger Things, eles conseguiram. A Netflix fez tão bem, na verdade, que seus concorrentes têm construído seus próprios serviços de streaming (A Disney apelou para o Disney Plus, a HBO apostou na HBO MAX, e a Universal Pictures criou a NBCUniversal), retirando seus próprios conteúdos da Netflix. É com certeza um golpe forte na Netflix, pois algumas de suas séries mais assistidas, como Friends e The Office, estarão saindo do catálogo. Já vimos as consequências da ascensão da Disney Plus, que levou à dissolução da parceria Marvel/Netflix.

Depois, há a questão da promoção: com tantas séries saindo apenas da Netflix (para não mencionar a enorme quantidade de conteúdo disponível em todas as outras plataformas), é preciso muito barulho (e dólares em anúncios) para cativar o público. Muitos criticaram a Netflix por gastos excessivos para promover seus principais programas, ao mesmo tempo em que deram menos atenção às séries menores e mais recentes.

Só que não é apenas uma questão de publicidade, mas de visibilidade dessas séries no próprio Netflix. Graças ao seu algoritmo todo-poderoso e misterioso, séries menores não estão recebendo a promoção on-site do que merecem. A criadora de Tuca e Bertie, Lisa Hanawalt, até reclamou que ela não conseguiu encontrar o programa que ela mesma criou:

E ela não está sozinha: muitos espectadores que assistiram BoJack Horseman disseram que Tuca e Bertie nunca foi recomendado pra eles (Hanawalt trabalhou em BoJack e Tuca foi produzido pelo criador de BoJack, Raphael Bob-Waksberg). Acrescente a isso o viés racial inerente ao algoritmo, e você tem um padrão angustiante que coloca as novas séries em desvantagem.

E, claro, há o fator não quantificável do sexismo: no geral, séries produzidas por homens têm mais chances de sucesso que as produzidas por mulheres. E isso não é um problema exclusivo da Netflix: há um resistência generalizada com mulheres no meio do entretenimento.

Enquanto os homens controlarem a maioria dos estúdios e redes, sempre haverá preconceito no entretenimento. Até que mulheres CEOs e executivos atinjam a paridade, as chances sempre favorecerão séries masculinas, seja para criadores, escritores ou estrelas. E esse é um problema sistêmico massivo que vale a pena enfrentar.


Fontes: TheMarySue | 2

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