E tá tudo bem.

O post a seguir contém spoilers das três temporadas da série The Boys, da Amazon Prime Video.

The Boys é uma das séries mais populares do momento, com sua abordagem abertamente nojenta e por vezes hilária da cultura das celebridades, da política nas redes sociais, e de vez em quando, das histórias de super-heróis. Mas nós precisamos pedir uma coisa para a próxima temporada da série: deixem as garotas terem tantos defeitos quanto os garotos!

É claro, todos os personagens da série têm algum defeito, porque o mundo é assim. E graças a inversão de gênero de alguns personagens dos quadrinhos, a versão para TV tem uma boa quantidade de mulheres imperfeitas, ou mesmo claramente vilanescas. Mas na quarta temporada, adoraríamos ver um pouco mais dos defeitos de duas das personagens centrais que sempre foram mulheres nos quadrinhos: Annie e Kimiko.

Maeve, Annie e Kimiko

Nós temos três protagonistas mulheres em The Boys – A Rainha Maeve (Dominique McElligott), uma das mais poderosas heroínas integrantes dos Sete; Annie/Luz Estelar/Starlight (Erin Moriarty), que começa a primeira temporada como a mais nova integrante dos Sete; e Kimiko (Karen Fukuhara), uma ex-soldado que se tornou uma heroína contra a própria vontade por um grupo de terroristas. Kimiko era inicialmente conhecida como “A Mulher”, mas graças ao personagem original da adaptação para TV, Mesmer (Haley Joel Osment), seu nome foi revelado durante a primeira temporada. Ainda temos muitos apelidos no mundo dos super-heróis, e o Francês só teve seu nome revelado na terceira temporada, mas é bom não termos mais uma personagem que só é identificada por seu gênero.

Todas as três personagens, apesar de seus poderes, têm sido frequentemente colocadas no papel de vítimas, e seus arcos de história têm focado na recuperação de sua própria agência. Os redatores fizeram um ótimo trabalho ao apresentar Annie como uma sobrevivente e alguém que retoma o controle sobre a sua própria história, culminando no abandono dos Sete para se juntar aos The Boys no final da terceira temporada. Mas ainda assim, para chegar lá ela teve que sofrer violência sexual, intimidação e humilhação pública.

Kimiko assumiu o controle de forma similar nesta última temporada. Ela foi vítima de tráfico de pessoas na infância, e teve o Composto V injetado em seu corpo contra a própria vontade, desenvolvendo aversão aos próprios poderes por causa disso. Ao escolher recuperar os poderes depois de perdê-los, ela explicou a Annie que o importante dessa vez é que essa escolha era dela. E Maeve, a mais empática dos Sete (não contando com Luz-Estelar), também conseguiu escapar de um padrão constante de vitimização pelas mãos do Capitão Pátria, que queria inclusive colher seus óvulos contra a sua vontade, ao se sacrificar, forjando assim a própria morte.

Parodiando o “Girl Power”

É ótimo ver essas personagens femininas assumindo o controle na história. Essa é uma narrativa genuinamente interessada nas personagens, e não uma mera tentativa de forçar um momento Girl Power, como na fantástica paródia “Girls Get It Done”, dentro do universo da série (que zombava na tentativa ridícula do Universo Cinematográfico Marvel de compensar os 20 filmes estrelados por homens, com uma cena curtíssima reunindo todas as mulheres sobreviventes para lutarem juntas em Vingadores: Ultimato). Mas ainda assim, Annie e Kimiko ainda têm problemas com relação a uma coisa – elas não possuem defeitos o suficiente.

Claro, Kimiko se preocupa com a sua natureza violenta e resiste a ser usada como uma arma por Bruto (Butcher). E Luz-Estelar talvez pudesse ter feito mais para impedir que seu amigo, Alex, se juntasse aos Sete. Mas enquanto o Francês é cheio de vícios e problemas no passado, Leitinho (Mother’s Milk) tem problemas de temperamento e tenta equilibrar seu relacionamento com a ex e com sua filha, Hughie abusa do Composto V para se sentir mais másculo em seu relacionamento com Annie e Bruto não tem limites para conseguir o que quer enquanto luta com a tentação para não se comportar como seu pai abusivo –  Kimiko e Annie são muito boazinhas e sensíveis. Elas basicamente funcionam como as “consciências” dos seus pares românticos (o Francês literalmente chama Kimiko de “meu coração” – mon coeur), como a voz da razão. Mesmo Maeve, que possui vários defeitos, ainda assim é dez vezes mais correta e bem-intencionada do que Trem Bala (A-Train), Profundo (The Deep) ou Black Noir.

Basta compará-las às personagens que tiveram seu gênero alterado na adaptação para TV. Este é o grupo de personagens femininas com defeitos de verdade. As vilãs Tempesta e Victoria (originalmente Victor) Newman são egoístas, arrogantes e impiedosas. Do lado heroico, Grace (originalmente Greg) Mallory é uma pessoa geralmente boa, mas cheia de segredos e com um lado rancoroso e agressivo. E a interpretação da série de Madelyn (originalmente James) Stillwell é fascinante. Seu domínio sobre o Capitão Pátria se torna especificamente relacionado ao gênero, uma vez que ela utiliza seu fetiche por leite materno para controlá-lo, alternando em momentos de domínio e medo do personagem. Comparadas com elas, Annie, Kimiko e até Maeve parecem anjinhos perfeitos de luz.

Histórias de seus próprios problemas

Não nos entenda errado: nós amamos Kimiko e o Francês juntos, e até podemos torcer para que Annie e Hughie deem certo (com muito menos intensidade). E Maeve mais do que merece ter um pouco de paz em sua merecida aposentadoria (apesar de duvidarmos que isso vá acontecer).

Mas adoraríamos ver arcos de desenvolvimento de personagem para Annie e Kimiko, com foco em seus próprios problemas, do mesmo jeito que os garotos tiveram. Tem sido muito legal vê-las superando adversidades externas, mas talvez fosse bom vê-las enfrentando adversidades internas, também. Poderíamos ver Kimiko lidando com problemas de confiança, ou talvez uma história que dependa de seu passado, que ela tenta fugir mas teria que enfrentar para resolver um problema. 

Vamos ver quais problemas no relacionamento entre Annie e Hughie surgiram de seus defeitos, e não apenas dos dele. Será que ela tem ressentimento por ele ter insistido que ela continuasse nos Sete, causando inclusive a morte de Alex? Fazer parte do clube dos garotos faz com que ela sinta falta de seu papel antigo, como heroína adolescente? Ela já se sentiu tentada a pular na direção do Soldier Boy até que ele exploda os poderes para fora do corpo dela?

Obviamente a série é intitulada “The Boys”, e os “garotos” são o foco. Mas nós achamos que seria realmente empolgante ver as personagens femininas sendo exploradas em seus defeitos, cometendo erros como suas contrapartes masculinas, e não eternamente no papel de vítimas, sobreviventes ou como a voz da consciência dos homens da série.


Post traduzido e adaptado da Den of Geek, com autoria de

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