Já deu, gente.

O texto a seguir é um relato de Natalie Degraffinried, editora da página Kotaku, e foi traduzido tentando manter o máximo de fidelidade possível com a publicação original. Leiam com carinho! (:

Eu não sou nova nesse negócio de Pokémon. Quando eu era jovem, entupida de doces e atormentada pela emoção viciosa do Safari Zone, eu decidi que iria capturar todos eles! Anos antes da franquia de Katamari Damacy tornar minha ganância capitalista algo de níveis gigantes, mais de uma década antes de Pokémon Black e White parar para pensar que “talvez não seja assim tão certo capturar centenas de animais selvagens e obrigá-los a lutar de forma brutal com o poder puro dos elementos que carregam”, uma versão minha de sete anos de idade decidiu capturar todos as 150 espécies de Pokémon disponíveis em Pokémon Blue. O fato de que a ampla maioria deles iria definhar dentro do limbo digital das boxes criadas pelo NPC Bill não seria capaz de me impedir. Ou seja: eu cheguei a Pokémon Sword e Shield calejada.

Em Pokémon Blue, eu capturei cada um dos Pokémon que estavam disponíveis no ambiente, salvo por aqueles que eram exclusivos de Pokémon Red. Era uma obrigação. Nos dias em que a interface de usuário era a mais simples possível, percorrer cavernas e me arrastar pela grama alta conseguiu entediar até a minha jovem mente obcecada por Pokémon. Apesar disso, eu não desisti, motivada em 10% de determinação e 90% pelo discurso motivacional que recebi da minha mãe: “Eu não vou comprar outro jogo pra você, nós acabamos de comprar esse. Pare de agir como uma criança mimada!”.

Não tendo conseguido convencer meus pais que eu precisava de dois jogos praticamente iguais, eu teria de encontrar outra forma de capturar Ekans, Oddish, Mankey, Scyther e Electabuzz. Por sorte, um amigo comprou Pokémon Red – e essa foi a parte fácil. O que causou problemas foram os Pokémon que você recebe de NPCs e que não estão disponíveis na natureza. A primeira complicação: você recebia um Eevee por jogo, e podia evoluí-lo em Flareon, Jolteon ou Vaporeon. Tanto eu quanto meu amigo amávamos o Jolteon e queríamos ter um. Eu não estava empolgada com a possibilidade de evoluir meu Eevee em um Vaporeon ou Flareon, mas eu estava realmente determinada em preencher minha Pokédex. Fiz um Flareon. Outra dificuldade: você só pode pegar um Hitmonlee ou um Hitmonchan do mestre do dojô de luta em Saffron City (eu acabei escolhendo o Hitmonchan, que tinha a aparência menos idiota). Após algumas operações através do Link Cable, eu finalmente capturei todos eles. Inclusive um Mew que meu amigo capturou usando Gameshark. E foi divertido pra caramba.

Talvez nem tanto. Mas o diploma que eu recebi por isso foi legal, eu acho.

Nas duas décadas seguintes, eu joguei cada uma das gerações de Pokémon, assim que os jogos foram lançados, inclusive os remakes e sequências diretas. E me diverti com muitos deles, fiquei entediada com outros. A cada novo jogo, os Pokémon dos meus times receberam nomes dentro de um tema. O Bad Bitch Squad (Esquadrão das “Meninas Malvadas”, em tradução amigável) chegou para a batalha, liderado pela diva Primarina que não aguentava enrolação. O Club 96 chegou, e Lola, a Scorbunny, estava lá para enfiar o pé de coelho da sorte nos traseiros! E sim, eu realmente me sinto apegada aos meus Pokémon, esse é o ponto que quero deixar claro.

Mas não sou apegada a ponto de ignorar as milhares e milhares de horas que pessoas dedicaram a criar uma nova experiência em um mundo completamente novo. Assim que a Game Freak anunciou que certos Pokémon não seriam transferíveis para Sword e Shield, as pessoas perderam completamente a razão e chegaram a apelidar a ausência destes monstrinhos de “Dexit” (referência ao Brexit, uma vez que Galar é inspirada na Inglaterra). Como um bando de turistas americanos exigindo um frappuccino em um café italiano, esse grupo de fãs de Pokémon decidiu fazer um inferno na Terra até que os Pokémon que eles querem sejam trazidos para as novas regiões. Dane-se a cultura ou o trabalho das pessoas.

Os jogos sofreram ataques em reviews antes mesmo do lançamento, algo que parece ser uma tendência quando os jogos possuem qualquer controvérsia. Houve ameaças de morte. Alguns começaram a comparar a Game Freak com a Bethesda. Foi lançada inclusive uma série diária de imagens de “famílias de Pokémon abatidos”, que um fã decidiu publicar até que “o Dexit seja revertido”. Outros fãs começaram a criar quebra-cabeças sobre o design de Sword e Shield. Muitos estão dando tapinhas nas próprias costas pelos esforços contínuos em criar problemas onde eles não existem. Sim, nem todos os incomodados estão sendo tão melodramáticos – algumas pessoas criaram mods impressionantes (o que eu apoio), e outros preferiram homenagear a empresa com hashtags bestas como #GameFreakLied (Game Freak mentiu). Mas alguns estão realmente perdendo a noção.

Claro, você pode capturar um corgi elétrico em Sword e Shield, mas por que fazer isso quando você pode gastar seu tempo reclamando? Eu percebi que muitos dos fãs estão realmente presos a esses dados que eles vêm carregando desde a infância, mas…

Meu velho e empoeirado Charizard já está cansado. Ele pode descansar em vez de ser trazido para outro país, para ser atingido por rajadas de bolhas e deslizamento de pedras, pelo bem de uma medalhinha ou outra coisa do tipo.

Você sabe quem pode ser capturado na Wild Area de Pokémon Sword e Shield? Um maldito Jolteon! Gita capturou um enquanto andava no meio de uma tempestade elétrica. Sabe quem mais você pode capturar – e não vou cansar de fazer isso – na Wild Area? Um maldito Hitmonlee. Eu vi um bando deles correndo. Desde o início do jogo você pode capturar a forma bebê dele, o Tyrogue, que é outro Pokémon que você só conseguia com um NPC em seu jogo original. A partir daí, você pode por conta própria treinar e evoluir quantos Hitmonchans, Hitmonlees e Hitmontops você quiser, ou apenas não o evoluir por ser fofo, e então capturar um monte evoluído para encher a Pokédex sem ter de se preocupar com isso.

Esse jogo é uma carta de amor para os fãs de longa data.

Antes de ganhar a primeira insígnia, eu vi um Rhydon antes mesmo de ter encontrado um Rhyhorn. No jogo original, você só encontra esses Pokémon na Victory Road. No meu time, eu tinha um Farfetch’d Galariano, que consegui evoluir em Sirfetch’d. O jogo tem um Lucario selvagem que você pode capturar, que ruge para os céus antes de correr igual ao Naruto atrás de você. Tem Hitmontops lutando capoeira!

As animações são tão adoráveis e feitas com cuidado e carinho – o que só torna mais frustrante para mim ver os fãs criticando e insistentemente presumindo que a Game Freak não gastou tempo nesses modelos, com tanta credibilidade quanto o meu tio que trabalha na Nintendo e definitivamente existe.

Sabe, eu poderia continuar.

Os jogos da série Let’s Go brilhantemente apelaram para a possibilidade de se capturar Pokémon que eram tão raros nos jogos anteriores que apareceriam na sua Pokédex como de “Área Desconhecida”, o que significava que você somente poderia capturá-los em eventos ou por meio de NPCs. Capturar um Charizard selvagem ou Bulbassauro em Let’s Go foi algo surreal. E Pokémon Sword e Shield levou isso a outro nível ao estender a possibilidade a outras gerações, dando vida a vários Pokémon antigos. O resultado foi um jogo que é mais satisfatório do que muitos dos jogos têm sido nos últimos anos. O número de formas Galarianas de Pokémon antigos foi a cereja no topo. Mesmo a evolução do Meowth de Galar, Perrserker, que parece querer colonizar o meu país e me infectar com catapora…

Pokémon Sword e Shield são recheados de escolhas de design que apelam exatamente para o tipo de fãs que parece ter uma tendência a reclamar do “Dexit” – jogadores de longa data, que cresceram tratando os Pokémon como amigos e seguiram essa filosofia de forma literal.

Os jogos têm tantas coisas desenvolvidas especificamente para os fãs mais sérios, e ver esse enorme contingente de pessoas sendo barulhentas e rudes, perdendo completamente a noção, me faz querer socar uma parede.

Eu não ligo para críticas sobre o jogo como um todo. Têm várias coisas que genuína e razoavelmente podem ser criticadas sobre ele. Só das coisas que não gostei eu posso fazer uma listinha:

  • Sandaconda parece um brinquedo sexual masculino. E o fato de ter esse nome não ajuda em nada.

  • Você não pode rodar o modelo de seu personagem com o analógico direito quando está usando controles casuais. Se eu posso fazer compras com uma mão na vida real, eu esperava poder comprar roupas usando uma mão no meu jogo de Pokémon.

  • Essa nova forma do Meowth? Eu sinceramente não sei… (Já perceberam que é só uma barba e não um gatinho peludo? Eeew)

Gente, na boa. Eu entendo a paixão por trás desses jogos. Muitos de nós cresceram com eles, se tornaram gamers por causa deles.

Mas essa é mais uma razão para que possamos criticá-los respeitosamente e de maneira razoável. Nada justifica as ameaças de morte, os ataques diretos e os chiliques.

Para os fãs que se sentem mal em deixar seus Pokémon antigos no passado, eu tenho uma boa notícia que recebi de uma mulher aleatória perto de um Centro Pokémon.

(Eu ouvi falar que Pokémon em Pokébolas ou Boxes ficam bem e confortáveis)


Texto traduzido e adaptado da Kotaku.

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