Tem que haver críticas sim. Mas elas devem ser justas. A nossa está, essencialmente, na primeira temporada.

Com a entrada de Avatar: A Lenda de Aang (ou O Último Dobrador do Ar) no catálogo da Netflix norte-americana, os fóruns de discussão da série e comunidades voltaram a se agitar, fazendo com que muitos de nós, jovens dos anos 1990, sintamos aquela nostalgia! Mas um dos assuntos centrais de discussão tem sido a comparação da série original com seu spinoff, A Lenda de Korra, e a diferença entre os materiais.

Tendo assistido a todas as temporadas das duas séries, posso afirmar que apesar de Korra ter sido formidável em vários aspectos, sua narrativa e abordagem política começam mais confusas que as de Aang, NA PRIMEIRA TEMPORADA. Mas, pra começar, vamos dizer que vários dos problemas de A Lenda de Korra estavam presentes em A Lenda de Aang, mas em um nível menor:

Na primeira série, o conflito central é derrotar um império totalitário do mal. As realidades políticas de como isso seria, ou sobre como a Nação do Fogo abriria mão das coisas não foram discutidas. Quando a série original terminou, muitos de nós ainda não entendíamos nada sobre política, mas quando Korra começou, essa realidade já era outra.

Então ao entrar no mundo de Korra, o vilão da história, Amon, é alguém que luta contra os privilégios e a desigualdade entre dobradores e não-dobradores. Nós já éramos capazes de entender essa linguagem, e a forma como a série abordou essa questão poderia ser mais complexa ainda.

Durante toda a série, tanto em Aang quanto Korra, nós vimos como a capacidade de dobra lhe garante vantagens, não apenas em combate, e como quase todos protagonistas são dobradores. Em Korra, vemos trabalhos e esportes exclusivos para dobradores. E ainda assim, o argumento de Amon é um tanto retalhado pela narrativa, por causa de sua presença maligna, máscara e especialmente pela revelação de que ele é um dobrador.

“HIPÓCRITA!!!”, é o que a série parece querer fazer a gente gritar nesse momento. Mas esse é o mesmo tipo de lógica deturpada do “ah, você critica o capitalismo mas compra coisas e trabalha pra uma empresa?” que costumamos ver nas redes sociais.

Quando você trata a perda de um privilégio como se fosse a morte em uma cena, isso só mostra que você não entende realmente o que é um privilégio.

Essa é a raiz da minha frustração com a primeira temporada de Korra, mesmo que tenhamos de entender que a série teve seus problemas com a Nickelodeon, com relação à idade. É sabido que a empresa queria que Korra fosse mais infantil, e que seus criadores queriam que ela fosse mais adulta, criando uma tensão entre as duas partes. A série faz a mesma coisa que a original fez com Ozai ao colocar todo o fardo da vilania sobre um único personagem.

A diferença é que você pode fazer isso quando combate um império totalitarista do mal, mas ideologias políticas como anarquismo, comunismo, nacionalismo e colonialismo não existem personificadas em uma pessoa. Elas são construídas ao redor de movimentos, pequenos ou grandes, compostos tanto de trabalhadores quanto intelectuais. E você não “resolve a questão” derrotando um cara ruim. Tanto que as HQs de Aang tratam disso depois!

Foi uma luta épica? Foi. Mas a narrativa do vilão foi suficiente?

Mas A Lenda de Korra não é uma série ruim. Pelo contrário, é maravilhosa! Como já afirmei, os livros 3 e 4, “Mudança” e “Equilíbrio”, respectivamente, colocam no centro da história a evolução de Korra, e o shipp (CANON!) de Korrasami arrebenta os nossos corações.

Os saltos temporais e as histórias mais contidas emocionalmente encaixam melhor em uma série que tenta lidar com “temas adultos”. A animação é excelente, e quem não se emocionou com o retorno da dobradura de ar para o mundo ou sobre o significado disso para Aang, não tem coração.

Além disso, com o tempo, Korra pôde tratar muito bem da questão política! É só ver como a segunda e terceira temporadas fazem isso bem!  Certamente, isso fez parte da briga entre os criadores e a Nick. É revolucionário poder ver a narrativa de uma personagem feminina e etnicamente indígena. 

E mais, a representatividade bissexual presente em Korra e Asami é algo importantíssimo.

Boa parte dos personagens, inclusive, mesmo aqueles simpáticos enquanto você assiste à série, não conseguiram ser marcantes. Mako e Bolin, na minha opinião, não competiram com o carisma dos personagens que eram o fator humor de A Lenda de Aang. Comparar qualquer um deles com o Sokka pra mim seria ofensivo. Os dois são ótimos, mas não consigo mesmo comparar.

Mas o fato é que Korra foi, de muitas formas, uma série mais ambiciosa, e por isso ela divide tanto as opiniões.

E é uma besteira dizer que não devemos comparar as duas: elas acontecem no mesmo universo e boa parte dos momentos emotivos de Korra vêm das histórias compartilhadas neste universo.

As pessoas pegam pesado com Korra? Às vezes. E arrisco dizer que parte disso vem da incapacidade de lidar com personagens femininas e étnicas que são barulhentas e problemáticas.

Mas a verdade é que a qualidade da série é algo que vale a pena discutir, debater, mas sem ser babaca com relação a isso. Há muitas discussões interessantes sobre o tema na internet, especialmente sobre os problemas da abordagem política adotada.

Temos que aprender a criticar as nossas séries favoritas, sem nostalgismo. São essas discussões que permitem que as animações do futuro sejam melhores.


Texto traduzido e adaptado do TheMarySue.

Leia mais sobre Korra aqui no site!

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