Um mangá fofíssimo e super importante.

Uchi no Musuko wa Tabun Gay (Eu Acho que Nosso Filho é Gay, em tradução livre) é um daqueles mangás que podem fazer você sentir uma conexão pessoal, pois traduz experiências reais em ilustrações com um estilo fofíssimo de arte. Ter uma mãe que acha (ou sabe, é claro) que você é gay, mas que espera pacientemente pelo momento em que você resolve se abrir é uma situação que muitas pessoas conhecem bem. E esse mangá conta a história de uma forma incrivelmente sensível e saudável.

Honestamente, essa é uma história que deveria fazer parte do acervo de qualquer biblioteca ou sala de aula.

Vamos falar um pouco sobre o mangá. Apesar de abrigar uma família de quatro pessoas, a residência Aoyama é tipicamente ocupada por três pessoas, por causa do trabalho de Akiyoshi, o pai. Enquanto ele trabalha, Tomoko (a mãe) e seus dois amados filhos, Hiroki e Yuri cuidam de suas vidas cotidianas – indo para a escola, fazendo o jantar, cuidando das tarefas de casa, etc. Mas agora que Hiroki entrou no ensino médio, seus pensamentos começam a mudar em direção a romances e uma vida sexual… E a sua mãe não consegue deixar de perceber alguns deslizes quando ele fala sobre o assunto.

Tomoko apoia o seu filho, e ao suspeitar que ele possa ser gay, ela prefere deixá-lo entender os seus próprios sentimentos por conta própria. Infelizmente, Hiroki é péssimo em guardar o seu “segredo”, e então ele pode acabar morrendo de vergonha antes mesmo de poder se abrir sobre os seus sentimentos.

Muitos jovens, ao revelarem para as suas mães a sua sexualidade, acabam sendo surpreendidos pelo fato delas já saberem e, por vezes, apenas esperarem o momento certo para revelarem isso. E às vezes, imaginamos porquê elas não são francas desde o início, já que isso poderia salvar muita preparação e nervosismo.

Mas depois de ler o primeiro volume do mangá, certamente nós conseguimos entender os motivos porque elas podem preferir esperar.

A leitura é muito doce. Cada capítulo tem apenas algumas páginas, e o foco costuma ser em momentos que aumentam as suspeitas de Tomoko. Hiroki obviamente não é nem um pouco discreto. Ele não troca o pronome uma vez sem querer. Ele é o tipo de cara que fica falando por minutos a fio sobre o que ele gosta em um garoto, sem nem perceber que estava falando de garotos o tempo todo. Em alguns momentos, são detalhes mais simples, como a felicidade ao receber um elogio do garoto que gosta, ou a forma como ele interpreta gestos simples… Um cumprimento do tipo “toca aqui” vira algo do tipo “MEU DEUS, NOSSAS MÃOS SE TOCARAM”.

Mas algo realmente tocante na leitura do mangá, é que ele não conta apenas a história de Tomoko tentando fazer com que Hiroki se sinta confortável para se abrir com ela. O mangá conta também sobre as dificuldades enfrentadas pelo seu filho, particularmente sobre coisas que muitas pessoas não conseguem enxergar. Por vezes, quando falamos sobre homofobia, as pessoas acham que estamos falando sobre gestos gritantes e abertamente violentos que são impossíveis de ignorar. Porém, aos poucos Tomoko vai percebendo que boa parte dos obstáculos enfrentados por Hiroki são mais silenciosos, “sem intenção” e que o rodeiam por todos os lados e há muito tempo.

Quando conhecemos o pai de Hiroki, ele é apresentado como um homem muito gentil, mas ele é responsável por muitas das coisas que tornam difícil a decisão de Hiroki em se abrir. Tomoko percebe isso e faz o melhor para resolver a situação, mas é claro que esses comentários fazem com que seja difícil para Hiroki se abrir com ela – ou com qualquer um. E é fácil perceber como o pai de Hiroki solta esses comentários de forma extremamente casual. Isso porque ele entende que ter uma opinião negativa sobre dois homens se relacionando amorosamente é algo normal e ele nunca foi confrontado sobre essa ideia.

Por mais que todos queiramos que as pessoas percebam a sua homofobia “casual”, a verdade é que as pessoas precisam ser confrontadas para perceber esses erros.

Felizmente, seu pai é confrontado sobre isso, e Hiroki acaba conseguindo ter mais tranquilidade. Mas como qualquer pessoa que cresceu rodeada por comentários casuais sobre como a homossexualidade é errada, nojenta ou “não natural”, nós sabemos que essas palavras marcam e impedem que principalmente os jovens venham a se abrir sobre sua sexualidade.

Tomoko passa por momentos em que ela lembra da infância de Hiroki e da forma como ele se comportava, mas ainda mais importante, da forma como seu pai respondia a isso. Ele (e por vezes, ela mesma, que não havia sido confrontada na época) demonstrava uma visão extremamente heteronormativa, algo que a sociedade nos condiciona a aceitar. Quando o jovem Hiroki disse que amava um garoto do seu grupo de amigos, ele foi “informado” que não era amor o que ele sentia, e que era muito novo para entender esse tipo de coisa.

Nós amamos a forma como esse mangá aborda temas como a frequência com que as pessoas assumem a heterossexualidade, e a frequência com que crianças ouvem que “não entendem” como se sentem, especialmente quando existe qualquer sinal de homossexualidade. O mangá demonstra claramente como isso se prende a você, te torna hesitante quanto a se abrir, mesmo para pessoas que te amam.

Sempre que o pai de Hiroki cai nesse padrão, Tomoko e mesmo o irmão de Hiroki, Yuri, o confrontam. É claro que o pai não tem a intenção de ferir, e também que ele ama a sua família, mas ele continua preso em uma mentalidade coletiva difícil de superar.

É “normal” perguntar ao seu filho se ele gosta de uma garota na escola, e Tomoko acaba percebendo durante a história o quão heteronormativo é tudo que envolve Hiroki.

Outra coisa maravilhosa é o aumento dos mangás LGBT com focos diversificados. Esse por exemplo, tem um foco na relação familiar, em que uma mãe permite que seu filho leve o seu próprio tempo para entender melhor a sua própria experiência.


Traduzido e adaptado do TheMarySue.

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