Frustrante.

A maldição no centro do anime Fruits Basket vai além da magia óbvia que transforma membros do clã Sohma em animais se eles abraçam outras pessoas. Os Sohmas estão todos presos às vontades e caprichos de Akito, que é quem representa o “Deus” do Zodíaco, e isso os impede de ter intimidade com outras pessoas. Como a encarnação do mal na série, Akito fez algumas coisas horríveis, incluindo abusar verbal, psicológica e fisicamente da maioria dos membros do Zodíaco, isolando-os de seus amigos e familiares, bater em uma criança, jogar uma garota pela janela e depois trancá-la em um barraco com comida e água limitadas, e, como se não fosse o bastante, esfaquear e cegar dois parentes.

Mas à medida que a protagonista e corajosa órfã Tohru Honda fica cada vez mais emaranhada com a família Sohma, o domínio de Akito sobre eles é ameaçado. E na temporada final, descobre-se que Akito é “tão vítima” da maldição quanto o resto de sua família, embora de uma maneira diferente.

*** ALERTA DE SPOILERS PARA OS EPISÓDIOS FINAIS DE FRUITS BASKET THE FINAL ***

Como o Deus do Zodíaco é tradicionalmente masculino, Akito foi forçada a assumir a identidade de um homem por toda a vida. Disseram-lhe repetidamente que as pessoas só ficavam perto dela porque eram forçadas. Sua mãe, com ciúmes do vínculo estreito que Akito compartilhava com seu pai, era verbalmente abusiva com ela. E após a morte de seu pai, Akito ficou isolada do resto da família.

Mas o problema com a última temporada de Fruits Basket não é necessariamente o fato de mostrar por que ela é do jeito que é, mas o que acontece depois.

Ao longo da animação, conforme Tohru se conecta aos membros do Zodíaco e eles começam a imaginar um mundo livre da maldição, então tudo que Akito conhece começa a se desfazer. Depois de conhecer Tohru – que é completa e infalivelmente gentil com ela, apesar de tudo – Akito percebe que algumas pessoas se preocupam incondicionalmente com os outros, sem as obrigações de uma maldição centenária. Depois que um acidente quase mata Tohru, Akito faz a escolha ativa de arriscar perder as únicas conexões que ela realmente conheceu, a fim de cortar a maldição e libertar os membros do Zodíaco. Podia ser o primeiro passo em seu caminho para a redenção.

Exceto que a história para por aí.

Depois de libertar os membros do Zodíaco, o que vem com grandes cenas emocionais arrebatadoras (e muitos abraços!), ela os cumprimenta com o seu verdadeiro eu – não o homem dominador que a maioria deles presumia que ela fosse, mas uma mulher em um quimono esvoaçante, o rosto maquiado e uma flor no cabelo.

E depois de falar muito vagamente “Vocês estão livres!” (nem mesmo consegue se desculpar por toda a dor que causou), ela simplesmente desaparece.

Não houve sequer um pedido de desculpas individual por toda a merda que ela fez os membros da sua própria família passar, que é literalmente o mínimo que ela poderia ter feito para começar a reparar seus erros grotescos. “Ei Rin, desculpe por te empurrar pela janela, quase te matar, te deixar com uma cicatriz horrível nas costas e depois te aprisionar em condições desumanas” poderia ser um bom começo, por exemplo.

Para não tirar completamente o crédito da série, ao menos mostram que muitos dos membros do Zodíaco não perdoaram Akito – e não há nem sinal de que os criadores os julgam por isso. No último episódio, o Cavalo do Zodíaco, Rin, diz que nunca será capaz de perdoar Akito, não da maneira que os outros fizeram. E o pior é que Akito afirma que permanecerá como a líder da família e que nem todo mundo vai gostar dela.

Mas a série não gasta tempo nenhum para interrogar essa linha de pensamento ou considerar as consequências do trauma e do abuso recorrentes de Akito ser a líder dos Sohma.

A maioria dos Sohmas se reúne para desejar boa viagem a Tohru e seu namorado Kyo, exceto Akito, que diz a seu próprio parceiro, Shigure (argh, o pior casal da história dos animes), que ela não sente que deveria interromper as festividades. E então eles continuam em seu pequeno encontro, e Akito parece feliz pela primeira vez em sua vida. O que é um pouco frustrante – sim, ela ficou traumatizada quando criança, mas ela também esfaqueou um homem e tentou assassinar várias pessoas, por isso é estranho vê-la sair totalmente impune, exceto por alguma culpa.

Às vezes, os vilões devem permanecer vilões. (cof cof, Cruella de Vil, cof cof) Nem todo vilão precisa de um arco de redenção completo. Certamente, há muitos casos em que um vilão permanecendo mau torna a história mais gratificante.

Isso não quer dizer que Akito deveria ter permanecido inteiramente uma vilã, para o contexto desta história, fazer ativamente a escolha de encerrar o ciclo abusivo do Zodíaco se encaixa tematicamente.

O problema é que Fruits Basket está preso numa narrativa estranha, onde se espera que sintamos empatia por Akito, mesmo que ela não enfrente nenhuma repercussão.

Embora esteja implícito que ela acabará por fazer as pazes e retificar suas ações, ela nem mesmo inicia esse processo dentro da série. E tem muito estrago feito para acertar, mas o karma ou a reparação simplesmente não estão lá.

O que poderia ser um arco de redenção emocional gratificante se torna numa frustração.

Akito fica na propriedade principal, mantém sua posição como chefe da família e começa a se envolver romanticamente com Shigure. Ela fica longe do resto da família, mas, além disso, não há fechamento emocional para suas ações.

Felizmente, Fruits Basket não é uma história sobre ela, então o anime não foi de todo arruinado. Embora a ação no anime gire fortemente em torno da família Sohma, ainda é, antes de mais nada, a história de como Tohru aprende a aceitar que as pessoas a amam. Em muitos aspectos, ela é uma contraposição para Akito, outra criança não amada que se sente um fardo para aqueles ao seu redor. Mas, em vez de ser cruel, Tohru escolhe amar as pessoas de qualquer maneira – não apenas seu interesse romântico Kyo, mas seus amigos de infância e a família Sohma, com quem ela se conecta profundamente.

Ao longo da série, Tohru conhece cada membro do Zodíaco e consegue conhecê-los, simpatizar com suas dores e ajudá-los. Cada um deles se apega a ela de uma maneira diferente e, no final, ela finalmente aceita que eles também a amam. Akito procurando cada membro do Zodíaco e expiando seus erros faria um paralelo importante e vital com o arco de Tohru. Mas a história para por aí. A jornada de Tohru chega a um fim emocional, com Tohru se mudando de cidade com Kyo, finalmente aceitando o amor que os outros têm por ela e escolhendo fazer as coisas porque a deixam feliz em vez de fazer os outros felizes. O possível crescimento de Akito é interrompido. É um desenvolvimento estranho e cortado que poderia ter reforçado os temas gerais do anime, mas que nunca teve a chance de acontecer.


Texto traduzido e adaptado da Polygon.

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