E é CLARO que os GaMErs ficaram chateados.
De acordo com o site oficial de Football Manager, a mecânica do jogo finalmente está sendo adaptada para introduzir times femininos. O texto foi produzido por Miles Jacobson, diretor de estúdio da Sports Interactive, a equipe por trás da série de videogames Football Manager e Championship Manager.
Antes de entrar em detalhes, Miles deixou claro que não tinha nenhum interesse em fazer uma versão independente do futebol feminino do FM, e sim adicionar o futebol feminino ao jogo – já que é o mesmo esporte, então faz completo sentido. Segundo ele, os jogadores passarão a gerenciar equipes masculinas e femininas, diversificando mais o estilo de jogo.
O artigo afirma que a mudança custará milhões e levará um tempo até ser completada no jogo, mas que a empresa quer ser parte da solução quando se trata de trazer mais igualdade em FM – e como isso é um espelho do futebol real:
Não há como esconder que atualmente existe um teto de vidro para o futebol feminino e queremos fazer o que pudermos para ajudar a quebrá-lo. Acreditamos na igualdade para todos e queremos ser parte da solução. Queremos fazer parte do processo que coloca o futebol feminino em pé de igualdade com o futebol masculino. Sabemos que não estamos sozinhos nisso – o acordo histórico com a TV que a Sky e a BBC fizeram recentemente com a WSL [superliga feminina da Inglaterra] é prova disso – mas pretendemos fazer tudo o que pudermos para levar o futebol feminino onde ele merece.
Sabemos que nossa voz é muito poderosa e queremos usá-la para o bem.
Miles passa a explicar que a empresa já tem acesso a uma base de dados de jogadoras femininas de futebol ao redor do mundo, e que por aí que vão começar. Ele explica também que não dá pra reutilizar o modelo dos personagens masculinos – porque há muito mais para adicionar o futebol feminino ao FM do que simplesmente substituir os jogadores masculinos por femininos.
Para acertar o banco de dados das nossas mulheres, teremos que examinar cada atributo do jogo e definir exatamente como julgamos os dados; atributos como ritmo, aceleração e agilidade provavelmente permanecerão na mesma faixa, mas alguns atributos podem precisar de uma escala diferente. Esses atributos também alimentam nosso mecanismo do jogo, é claro, e o trabalho realizado nesta área (por exemplo, observar a altura das jogadoras e como isso pode afetar o modo como elas jogam – como chutar mais alto se a goleira for menor) será benéfico para o mecanismo do jogo no geral.
Mas o bacana mesmo é que a empresa está levando a sério essa tarefa. Miles levantou a questão de que alguns elementos sobre a implementação de jogadoras femininas precisa de consideração mais cuidadosa. Por exemplo, a diferença no andar feminino:
As formas corporais das mulheres são diferentes das dos homens, assim como suas estruturas ósseas, então não temos escolha a não ser voltar ao início e recriar todos os nossos dados de animação usando jogadoras.
Além disso, ele cita o impacto do ciclo menstrual no treinamento e nas lesões, gravidez, considerações gramaticais específicas de gênero e outras mudanças que já estão em andamento e vão consumir a maior parte do orçamento.
É legal mencionar também que: a) a equipe conta com uma mulher no cargo de chefe de pesquisa, Tina Keech, uma treinadora qualificada; b) FM agora é parceiro comercial para a temporada 2021/22 com o Leicester City Women (clube inglês profissional de futebol feminino com sede em Quorn, Leicestershire), que mostrará a marca do FM nos bancos de reservas e em painéis de entrevista do clube.
É uma notícia maravilhosa, que enche nossos corações de uma pequena esperança para o futuro dos jogos. Esperamos que outros do ramo aprendam com FM – inclusão também requer mulheres nos bastidores, nos cargos de chefia, nas parcerias! Mostra que a intenção é genuína.
Por outro lado, seria surpreendente comentar que vários jogadores de FM ficaram putinhos com a notícia? A gente imagina que não. Separamos abaixo algumas das respostas que o post da empresa gerou no Facebook:
Tradução: “Vocês deviam colocar a liga japonesa no jogo em vez de futebol de mulheres!!! Quem liga pra futebol feminino?????”
“Eu me pergunto por que eles não fazem um jogo separado para mulheres? Ninguém vai jogar isso, apesar do aceno virtual deles aqui”
“É interessante como isso vai funcionar com a qualidade dos jogadores… Sendo realista, qualquer um dos TOP 15 da Inglaterra deve ser capaz de destruir o melhor time feminino que criarem. Espero que o jogo seja preciso”
Tradução: “Mal posso esperar para editar todas as lesões delas para queimaduras de ferro de passar, derrubou uma faca no próprio pé, tropeçou no esfregão, queimadura com óleo de cozinha, etc”
“Eu acho que é a primeira vez que sou a favor de uma DLC hahaha… Façam isso ser uma DLC… Vejam pelos lucros se é isso que seus fãs mais leais estavam esperando de Football Manager… Em vez de forçar agendas”
“Uau, mal posso esperar pra não jogar isso”
Tradução: “Grande uso de recursos para a 0.1% da sua base de jogadores que podem um dia pensar em jogar como técnico de um time feminino. Enquanto isso, continuem a lançar um jogo novo a cada ano com o motor de gráficos 3D imitando perfeitamente um jogo de futebol dos anos 90”
“Sem ofensas mas isso é um desperdício de recursos. FM 21 é bom mas tem tantos bugs que estão aí por anos a fio”
“Nada além de ceder à engenharia social… ninguém no mundo real leva o futebol feminino a sério”
Tradução: “Eu acho que FM é politicamente correto agora. O que vai vir depois?”
“Posso ter só a versão masculina e pagar menos, por favor? Se o jogo feminino fosse realmente necessário elas teriam um jogo próprio”
“Um desperdício de tempo. Apesar de todos os cavaleiros brancos tentando escrever em redes sociais, a realidade é que ninguém liga pra futebol feminino. Na minha opinião é um desperdício completo de recursos”
Felizmente, vários desses comentários estavam sendo respondidos por homens razoáveis e algumas vezes até pela própria página oficial de FM.
Na verdade, esses comentários machistas só demonstram e comprovam a necessidade dessas medidas serem implementadas – o mais rápido possível. Mas é meio inevitável perguntar: do que esses caras têm tanto medo? Futebol só se joga com o pinto? Eles já assistiram futebol feminino alguma vez na vida???
Querendo ou não, as mulheres virão – e nós já estamos ansiosíssimas pra ver jogadoras brasileiras como a Marta, Formiga, Christiane e várias outras em FM. E, claro, mulheres igualmente incríveis ao redor do mundo como a Megan Rapinoe, Sam Kerr, Lieke Martens, Lucy Bronze, Pernille Harder ou Wendie Renard.
Eu poderia fazer um longo debate aqui sobre como o futebol feminino é importante e rebater todos os comentários dos machistas que gostam de afirmar seu desprezo sobre ele na internet, mas só vou dizer que se vocês GaMeRs machinhos não gostam do futebol feminino porque quem joga são mulheres, vocês não gostam de futebol. Vocês gostam é de homens.
Débora é musicista, professora de artes, pesquisadora de sociologia de gênero. Autoproclamada otaku-não-fedida e gamer casual. A alcunha de Liao veio de um site aleatório de geração de nomes japoneses (Liao é chinês, mas tudo bem).
