“Jeremias – Pele” teve seu lançamento oficial dia 24 de abril e foi de arrepiar!
Rolou o lançamento da 18a Graphic MSP: Jeremias – Pele, com roteiro de Rafael Calça (Terra da Garoa, Jóquei) e arte de Jefferson Costa (Arcane Sally & Mr. Steam, La Dansarina). No evento, que ocorreu na Saraiva do shopping Center Norte, também compareceram o editor da Mauricio de Sousa Produções e idealizador do selo, Sidney Gusman, e o rapper Emicida, responsável pelo texto da 4a capa da obra.
Este lançamento rolou de uma forma diferente das outras graphics aqui em São Paulo. Antes da famosa sessão de autógrafo, teve um bate-papo com os convidados. Isso porque esta graphic novel pede por uma conversa.
Jerê era, até dezembro de 2017, quando foi anunciada a Família Sustenido, o único personagem negro do Bairro do Limoeiro, criado em 1960. E nem era da turma principal, composta por Mônica, Cebolinha, Magali e Cascão. Ele é da galera dos meninos mais velhos, mais descolados. Contudo, pouco se sabia do personagem. Tanto, que sua característica mais forte era seu famoso boné vermelho.
Daí que esta obra trata do racismo na infância, que é logo quando o negro no Brasil experimenta o preconceito. Por isso a conversa foi tão importante e frutífera.
Entre risos e desabafos, descobre-se que, praticamente, todas as situações de racismo que rolam na HQ foram realmente vividas pelos autores. E Emicida ainda adicionou que, muito do que leu ali, também aconteceu com ele, mostrando ser real a frase de Calça ao afirmar que a história é dele, mas não só dele.
Com a preocupação de serem fiéis à realidade brasileira, mas sem pesar muito a mão na crítica, afinal, ainda é uma obra da Maurício de Sousa Produções, Calça quis tratar a família de Jeremias como uma “família Doriana” (quem lembra dessa?), ou seja, uma família feliz, unida, que conversa e se apoia. Jeremias é um garoto que não passa necessidades, é sortudo. É a família que ele sempre quis.
E isso serve também como um cutucão às produções brasileiras, que sempre mostram o negro do mesmo jeito, como o morador de periferia, que possui uma família destruída, sem pai, sem mãe, infeliz. Como se a pior coisa que pode acontecer a um ser humano é nascer negro. E não é.
Claro que esta é uma realidade frequente, contudo, não é uma regra. Também existem aquelas mais estruturadas. E é um tipo de mensagem que ajuda a desestereotipar o negro na nossa cultura.
Expectativas
Por se tratar de uma HQ que fala de um personagem secundário e que traz um tema polêmico, Calça e Jefferson acharam que esta seria a Graphic que menos venderia do selo. Mas Gusman discordava. Tanto por confiar no trabalho dos autores, como por perceber que este é o momento ideal para se falar deste assunto. E sabe também que existe um público ávido por este material, que causa uma identificação naqueles que nunca se viram representados na cultura pop.
Gusman ainda disse que, nos seus perfis das redes sociais, a imagem da capa de Jeremias – Pele era a mais curtida, batendo hits como Turma da Mônica, de Vitor e Lu Cafaggi, trilogia queridinha do público das Graphic MSP.
Além disso, o fenômeno do filme da Marvel, Pantera Negra, foi uma prova disso. Há espaço e necessidade de mostrar outros heróis, outros protagonistas e histórias com outros pontos de vista e vivências nos quadrinhos, cinema e música.
Contudo, Jefferson vê esta obra como mais um importante e necessário passo dado para a conquista de um mercado mais plural e igualitário. Mas que ele ainda não verá esse mercado ideal. Mesmo com um cenário melhor, com mais editoras, mais espaço e oportunidades, ainda não se vê um mercado de quadrinhos consolidado.
E daí a importância de se acreditar na sua história, na sua vivência, pois é ela quem importa. Mesmo que existam limitações quando se faz parte de uma minoria, às vezes ela é libertadora. O criador faz com o que tem.
Revelações
Para a surpresa de muitos, Emicida revelou que antes de ser rapper seu sonho era ser quadrinista. E ele acredita que fazer quadrinhos e rap é algo muito parecido. O profissional das duas áreas tem sempre que se provar como trabalhador sério e que não está apenas se divertindo.
E ele se sentiu “feito criança” com a obra, de tanto que gostou dela, complementando que a sensação que Jeremias – Pele passa é de “até que enfim”. Pois até que enfim o personagem negro da turminha ganhou sua própria revista, sua história e sua voz.
Belle Felix, ou Lilo para os íntimos, não sabe dançar a hula, mas veste sua roupa de coelho e tenta sempre fazer seu melhor!
Tradutora do material da editora Valiant no Brasil, resenhista no Universo HQ e tem um site e canal no YouTube, o Plano Infalível.
E, sim, pretende dominar o mundo.