Mesmo por trás dos scripts, A Caminho da Lua é uma história comovente.

Desde o primeiro trailer, eu sabia que A Caminho da Lua, da Netflix, me faria chorar. A história de uma jovem que constrói um foguete para a lua em um esforço para encontrar a deusa da lua e evitar que seu pai tenha outros relacionamentos após a morte de sua mãe já soava como algo que ia quebrar meu coração em pedaços. Mas este filme divertido, surpreendentemente chinês (de verdade) e muito bonito é ainda mais do que isso. Em vez de apenas nos dar outra história sobre pais que morrem e filhos órfãos sofridos, é um filme inteiramente sobre como lidar com o luto e a dor e também sobre encontrar uma nova esperança.

*** O POST A SEGUIR CONTÉM PEQUENOS SPOILERS DO COMEÇO DO FILME A CAMINHO DA LUA ***

A Caminho da Lua tem como foco a jovem Fei Fei (Cathy Ang), cuja mãe faleceu. Quando seu pai (John Cho) traz uma nova mulher (Sandra Oh) e o filho dela, Chin (Robery G. Chiu), para o jantar em família na época do Festival da Lua, Fei Fei fica arrasada. A ideia de ver seu pai superando o luto por sua mãe era incompreensível, porque ela mesma acreditava que nunca superaria. Além disso, ela não queria um novo irmão caçula idiota do tipo que pensa que pode atravessar paredes.

Só resta uma solução para Fei Fei: ela tem que fazer seu pai acreditar na deusa da lua, Chang’e. A lenda da deusa da lua é muito familiar para os chineses. Chang’e e seu amante, Houyi, foram separados depois que ela tomou erroneamente uma poção da imortalidade destinada a ambos. Ela então espera eternamente na lua por seu amor perdido. Essa história e o festival da lua, que homenageia o amor dos dois, eram os favoritos da falecida mãe de Fei Fei.

Imagem: Netflix

A única solução para Fei Fei manter a memória de Chang’e e também de sua mãe vivas era construir um foguete para levá-la até a lua e encontrar Chang’e ela mesma. E bom, é exatamente isso que ela faz. Em uma mistura muito doce de uma típica história de heroína e um novo cenário que incentiva as meninas a entrarem no mundo do STEM (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática, em tradução), Fei Fei na verdade faz todo o processo de construção do foguete – do projeto escrito até todas as tentativas de falhas pra achar o protótipo perfeito – e o lança, levando seu leal coelho Bungee ao seu lado. O único problema nisso tudo foi que ela descobriu, em pleno ar, que Chin tinha entrado sorrateiramente como um passageiro clandestino do foguete. Isso quase estraga todos os planos, mas é aí que a mágica começa: Chang’e envia seus leões para salvar Fei Fei e Chin e trazê-los para a lua.

Então, sim! Chang’e é muito real, dublada como uma diva pop por Phillipa Soo. Ela governa um reino lunar cheio de criaturas “lunarianas” – e estava à espera de Fei Fei, confiante que ela tinha lhe trazido um presente que finalmente a permitiria se reunir com Houyi.

Pausa aqui só pra dizer que eu amo Chang’e. Ela é apresentada no filme cantando uma música pop incrivelmente cativante, “Ultraluminary“, que provavelmente vai ficar grudada na sua cabeça por algum tempo. Ela é o equilíbrio perfeito entre perigo, bondade, emoção profunda e magia pura – o que condiz bem com uma deusa lendária da China.

Imagem: Netflix

Mas acontece que Fei Fei estava de mãos vazias. Então ela, Chin e até mesmo Bungee fazem novos amigos na lua, incluindo um cachorro lunar muito divertido chamado Gobi (Ken Jeong), à procura do tal presente que Chang’e tanto queria. Daí em diante, tanto Fei Fei quanto Chang’e aprendem sobre como deixar a dor para trás e a lidar com a solidão que sentiam. E isso é feito em meio a alguns cenários impressionantes e uma trilha sonora adorável, com músicas que aproveitam ao máximo os talentos incríveis das dubladoras.

A Caminho da Lua foi visivelmente feito com total confiança e uma emotividade complexa e intensa, graças ao trabalho do diretor e lendário animador Glen Keane– o homem por trás de animações como A Pequena Sereia e A Bela e a Fera. Keane traz toda a sua experiência na área para contar uma história que é divertida, emocionante e que, com sorte, ocupará seu lugar ao lado de tantos outros clássicos.

A animação irá, inevitavelmente, e talvez justificadamente, sofrer comparações com Viva – A Vida É uma Festa (Coco, no original). Da mesma forma que Coco foi uma história única e profundamente mexicana que poderia ressoar com qualquer pessoa que se lembrasse dos ancestrais, A Caminho da Lua é uma história completa e lindamente chinesa, com temas e lições que deixarão todos os espectadores chorando.

É bom notar que o filme parece autenticamente asiático, não apenas porque todo o elenco de vozes no filme original é asiático, mas porque vem da Netflix em parceria com o Pearl Studio, que é baseado na China. Pearl foi o estúdio por trás de Abominable, que foi produzido junto com a Dreamworks, e que também foi um filme que realmente capturou o espírito do país e da cultura local – inclusive fica aqui de recomendação pra quem gosta de assistir animações com mais diversidade.

Imagem: Netflix

O que torna A Caminho da Lua tão especial é que, em vez de ser o filme típico em que o herói ou a heroína perdeu um dos pais e isso nunca é realmente trabalhado, é um filme que aborda diretamente a perda de alguém amado e formas de amar e viver bem novamente. E é essa história, assim como o que estava por trás do roteiro, que tornam as mensagens do filme ainda mais comoventes: A Caminho da Lua foi escrito por Audrey Wells, que depois de entregar seu primeiro rascunho, compartilhou com os produtores que havia sido diagnosticada com câncer. O filme foi escrito como sua última história, como uma mensagem direta para sua própria família sobre como estava tudo bem seguir em frente. “Ela queria que eu soubesse que o roteiro significava tudo para ela”, explicou o produtor Peilin Chou em materiais de imprensa. “Que era a carta de amor que ela deixaria para sua filha para ajudá-la a levar a vida adiante”.

E o que Wells deixou é realmente lindo: uma história que nos lembra de outras grandes missões infantis – como o filme favorito de Wells, O Mágico de Oz, uma daquelas viagens verdadeiramente profundas e belas, que se passam em outro mundo e que mostram à heroína como ter esperança e amar novamente em face ao desespero. Audrey Wells faleceu em outubro de 2018, aos 58 anos, e é lindo e comovente saber que esse filme foi seu legado.

Audrey foi também diretora do filme Sob o Sol da Toscana

A Caminho da Lua mostra que uma menina pode literalmente ir à lua com apenas um pouco de matemática e determinação, dando a várias outras meninas como ela uma heroína, ensinando que aqueles que amamos nunca estão longe.


Texto traduzido e adaptado do TheMarySue.

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