O filme incrivelmente consegue encaixar os setecentos milhões de personagens em uma história, mas no fim das contas é só um prelúdio para o próximo ‘Vingadores’


A missão entregue aos irmãos Russo, diretores de “Vingadores: Guerra Infinita”, era absurdamente difícil. Reunir 20 filmes, 10 anos de história e dezenas de personagens super conhecidos e queridos em um filme, sem que tudo pareça uma bagunça, parecia impossível. E só o fato do filme ter sido realizado merece muitos créditos. O resultado final, no entanto, não é livre de defeitos. Mesmo com uma história muito mais ousada do que os fãs previam, o filme não se sustenta sozinho, e, diferentemente do que a Marvel prometeu, termina no meio da ação e deixa os fãs sem um final satisfatório.

Com soluções interessantes para encaixar todos os personagens em uma história, o filme tem méritos a serem destacados. Núcleos foram quebrados e novos grupos redefinidos, de acordo com a afinidade na linguagem de cada filme. Tony Stark e Peter Parker, que já demonstraram ótima química em “Homem-Aranha: De Volta ao Lar”, se encontram com Doutor Estranho (um ego para rivalizar ao de Stark), e mais tarde com o carismático Star-Lord (também nada modesto). Thor se junta a Rocket Raccoon e a um Groot adolescente, e tem seu próprio plot, derivado diretamente de “Thor: Ragnarok”, o que ditou o tom do núcleo.

Quanta gente, menina...
Quanta gente, menina…

Os encontros desses personagens, que são a razão desse filme existir, são definitivamente bem explorados. Muitas das cenas de ação foram cuidadosamente criadas com o intuito de que as habilidades desses heróis fossem somadas. Vê-los lutando e trabalhando juntos é empolgante e satisfatório. E o filme não deixa a desejar em termos de ação. Com tantos núcleos e super-heróis para introduzir, seria muito fácil que o primeiro ato ficasse longo demais, mas os diretores se aproveitam da popularidade dos heróis, e de recursos como a trilha sonora de cada um, e agilizam essas apresentações de modo que a trama engatou rapidamente.

Os heróis que têm menos apelo humorístico, no entanto, parecem ter sido simplesmente jogados juntos em um subplot que praticamente não tem razão de existir. Isso acarretou diversos problemas. Desde personagens importantes, como a Viúva Negra, ficando totalmente em escanteio, até alívios cômicos descolados e constrangedores. Pela falta de um “engraçadinho” no grupo, Bruce Banner foi reduzido a uma piada repetitiva e forçada, esticando seu esquete de “Thor: Ragnarok” até ela não fazer mais sentido.

Corre, cambada!
Corre, cambada!

Mas os problemas com os alívios cômicos não se resumem ao Hulk. O peso dramático da trama é maior do que em qualquer outro longa dentro da franquia, e pela primeira vez no universo da Marvel, temos a sensação de que os riscos e as consequências são realmente altos. Mas o filme tem um enorme desequilíbrio de tom, e não oferece a oportunidade de digerir esses conflitos pessoais. Imediatamente depois de nos deixar com lágrimas nos olhos e um nó na garganta, a história nos atordoa com punch lines gratuitas. A falta de respiros não permite o devido sofrimento com o drama dos personagens, e transforma perdas que deveriam ser importantes em informações passageiras.

Por outro lado, o desenvolvimento do vilão é um dos melhores dentro do MCU. De carona com Killmonger, o melhor antagonista da Marvel, os produtores resolveram investir na motivação de Thanos, que com a banalização dos supervilões de CGI (muito por culpa da DC), era um enorme risco para o filme. Como anunciado, o filme acabou sendo mais sobre o próprio Thanos do que sobre os Vingadores, e isso funcionou perfeitamente. Seu relacionamento abusivo com as filhas, que permeou o tema de “Guardiões da Galáxia Vol. II”, é novamente o ponto central da sua narrativa. Mesmo sabendo que se trata de um genocida megalomaníaco, acreditamos que as intenções de Thanos são genuínas, e que na sua mente doentia seus planos fazem sentido.

Cheguei, bitches!
Cheguei, bitches!

O terceiro ato do filme é o mais ousado da Marvel até o momento. A direção que a história toma é surpreendente e chocante, mas com tantos personagens, fica difícil entender onde cada um está no final. Se é que podemos dizer que existe um final. O que os irmãos Russo prometeram foi um longa que ficasse de pé sozinho, com começo, meio e fim, mas o que entregaram foi uma meia história, completamente dependente do próximo longa, que só estreia no ano que vem. Isso, por si só, não seria um grande problema se a cortina não descesse tão repentinamente. No fim das contas, a sensação é de descrença e confusão, um efeito estranho para um blockbuster.

 


Texto originalmente publicado no Storia Brasil.

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