E sobre filmes que não recebem o reconhecimento que merecem.

Elle Woods (Reese Witherspoon) sempre foi subestimada. Depois de ser dispensada por seu namorado (Matthew Davis) por não ser “séria” o suficiente, a loira o segue até a Faculdade de Direito de Harvard, inicialmente para reconquistá-lo, e depois para provar que ele estava errado. Legalmente Loira extrai sua comédia da justaposição da atitude alegre e persistente de Elle com a atmosfera prestigiosa e intelectual de Harvard. Mas também cria tensão.

Com base no livro de Amanda Brown e suas experiências na vida real enfrentando oposição na Escola de Direito de Stanford, Legalmente Loira faz Elle ser menosprezada e ridicularizada por sua feminilidade. Elle não é burra (afinal de contas, ela conseguiu entrar em Harvard), mas os outros raramente a veem além de seu “cabelo loiro e peitos grandes”, presumindo que, por gostar de fazer compras, ela deve ser superficial.

Elle, em última análise, prova que eles estão errados, não por se conformar com suas expectativas, mas por demonstrar seu valor enquanto permanece fiel a si mesma.

O filme compartilha muitas semelhanças com outra comédia de amadurecimento sobre uma garota loira com poder de si mesma: o clássico As Patricinhas de Beverly Hills (1995), de Amy Heckerling. Cher Horowitz (Alicia Silverstone) também parece inicialmente uma garota insípida do vale das privilegiadas, outros a veem como uma “idiota com um cartão de crédito”, mas o filme mostra que não há nada de errado com o que Cher gosta. As Patricinhas de Beverly Hills é mais sutil e complexo do que Legalmente Loira, já que Cher tem sim algumas falhas que saltam os olhos, como se enxerir em assuntos como com quem Tai (Brittany Murphy) deveria namorar. Mas o filme não é feito para provar que os outros estão errados. Em vez disso, Cher demonstra uma inteligência sutil de estar ciente de como o mundo funciona, sem sacrificar sua personalidade. Como Elle Woods, Cher tem um conhecimento detalhado de moda, gosta exageradamente de “reformas” e carrega uma caneta fofa com uma ponta rosa. Ela até ajuda o pai com seu próximo trabalho de caso de julgamento. Cher mostra que sua feminilidade não é algo a ser superado, mas algo que pode ser abraçado.

Legalmente Loira e As Patricinhas de Beverly Hills são comédias, mas no final das contas são paródias desse estereótipo.

Esses filmes abordam o estereótipo de “loiras burras” e a presunção de que as mulheres que são abertamente femininas devem ser simplistas.

O público tinha ideias errôneas sobre feminismo no cinema, julgando que se tornar uma “mulher forte” significava abandonar os padrões de feminilidade. Basicamente, para se tornar mais masculina. Mas a verdadeira liberdade do feminismo é que as mulheres podem ser o que quiserem (inclusive mais masculinas) e que se preocupar com roupas ou penteados não as invalida.

Esses filmes defendem a autonomia e a inteligência dessas mulheres, ao mesmo tempo em que enfatizam a importância da amizade feminina, sem que suas protagonistas tenham que mudar seus hábitos.

Outro filme que se encaixa nesse subgênero pró-loira é o filme de 2000 de Steven Soderberg, Erin Brockovich – Uma Mulher de Talento. Erin (Julia Roberts) é lida apenas como uma “loira morango” (loira com mechas ruivas), mas ela impressiona todo mundo ao lidar com o caso legal contra a PG&E por sua contaminação do lençol freático. Como Elle Woods, Erin é subestimada por sua aparente inconformidade com o mundo jurídico. Ela é inicialmente demitida enquanto pesquisava o caso, e seu chefe Ed (Albert Finney) chega a admitir timidamente que tinha sido porque ela “parecia alguém que se divertia muito com aquilo”. Erin é mais velha, mais grosseira e mais incisiva do que Elle ou Cher, mas também não pede desculpas pela maneira como se veste ou age, e sua autoconfiança prova seu valor incomum ao longo do filme.

Este estereótipo de “loira burra” foi consolidado culturalmente por Marilyn Monroe. Em Legalmente Loira, o namorado de Elle até comenta sobre a necessidade de se casar com uma “Jackie e não uma Marilyn”. No entanto, a própria Monroe satirizava essas suposições jogadas contra ela, mesmo enquanto interpretava papéis que eram estereotipados. Os Homens Preferem as Loiras tem Marilyn interpretando a showgirl Lorelei Lee com sua melhor amiga Dorothy Shaw (Jane Russell), e embora ela seja toda glamorosa e aparentemente fútil, Monroe passa o filme todo autoconsciente dos homens ‘cabeça-de-vento’ que esperavam que ela fosse somente alguém assim e cria um argumento…. até que bem compreensível do por que ela deveria se casar com alguém rico: “Homens ricos são como garotas bonitas. Você pode não se casar com uma garota só porque ela é bonita, mas meu deus, isso ajuda muito”.

O machismo na indústria cinematográfica é obviamente muito difundido. Mas também afeta os filmes que consideramos valiosos.

Os 20 melhores filmes da IMDb são todos focados em “homens”, com o número 1 da lista tendo zero papéis femininos. As comédias românticas são amplamente descartadas, enquanto os filmes de terror de culto são elogiados. E, mesmo assim, os focados em mulheres como Garota Infernal foram subestimados quando foram lançados e só foram reavaliados mais recentemente, caindo um pouco mais no gosto do público.

Isso não quer dizer que filmes considerados “masculinos” sejam ruins, mas que nossos critérios devem ser expandidos. Essas comédias e musicais adolescentes são divertidos e bobos, mas não são apenas frívolos. Como as mulheres loiras dentro deles, eles contêm uma complexidade mais rica do que as impressões iniciais sugerem. Eles podem ser impenitentemente femininos sem sacrificar sua inteligência, uma vez que os dois nunca foram mutuamente exclusivos em primeiro lugar.

Precisamos aprender a ver filmes assim com outros olhos.


Texto traduzido e adaptado da GameRant.

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