Veja uma entrevista exclusiva dos autores para o Garotas Geeks 😀

É bastante comum no dia 08 de março, Dia Internacional da Mulher, sermos homenageadas com rosas. Pois três quadrinistas brasileiros resolveram fazer mais e presentear as mulheres brasileiras com Pão e Rosas.

Trata-se de uma webHQ, uma versão romanceada da Greve do Pão e Rosas, com roteiro de Hector Lima (Sabor Brasilis), arte de Mario Cau (Dom Casmurro, Terapia) e letras de Pablo Casado (Mayara & Annabelle).

pao-e-rosas-detalhe-04

A obra foi disponibilizada na sexta-feira, dia 07 de março, simultaneamente e de forma gratuita, pelos sites Fictícia  e Petisco, dois dos mais importantes selos de quadrinhos independentes do Brasil.

Sobre o evento: Em janeiro de 1912, uma greve de cerca de 20 mil trabalhadores da indústria têxtil parou a cidade norte-americana de Lawrence, no estado de Massachusetts, por mais de dois meses. Ninguém acreditava que crianças e mulheres, em sua maioria imigrantes que se submetiam a condições terríveis, conseguiriam se organizar em protesto a um corte de salário. A greve em Lawrence foi uma das mais marcantes da história da emancipação feminina, pela duração, quantidade de mulheres e crianças, além da atenção que gerou para a desigualdade de gênero.

pao-e-rosas-detalhe-01

A webHQ mostra o depoimento da jovem operária Camella Teoli para o Congresso norte-americano, ao mesmo tempo em que retrata a opressão às grevistas. Pão e Rosas é um trabalho muito bem feito, bastante forte, inspirador e reflexivo. A obra é curta e deixa a gente com um gostinho de quero mais, de saber mais sobre os destinos de Camella e da família de Anna Lopizzo, trabalhadora morta no protesto.

Aproveitei o lançamento de Pão e Rosas para fazer uma entrevista exclusiva com os autores, que falaram sobre os bastidores deste projeto, suas carreiras e o FIQ 2015.

GG: Como (e de quem) surgiu a ideia para este trabalho?

Hector: Um bom tempo atrás recebemos um convite de um editor independente norte-americano para participar de uma coletânea sobre trabalhadores, baseada em fatos reais. Escolhemos essa história, baseada em uma greve real de mulheres e crianças. Infelizmente a coletânea nunca saiu, e guardamos a história até percebermos que seu tema era mais importante que o suporte em que seria publicada.

Mario: Fui convidado pelo Hector para desenhar a HQ, mas infelizmente ela não chegou a ser publicada na época, naquela coletânea.

GG: Quanto tempo durou o projeto desde a primeira ideia até a conclusão?

Mario: Depois de resolver os estudos dos personagens e os layouts das páginas, eu costumo produzir bem rápido, mas essa HQ deu um trabalho a mais. Usei várias referências fotográficas para me manter fiel ao cenário da época e aos trajes. A arte-final foi toda feita em pincel e nanquim, e as cores, em ecoline (um tipo de aquarela líquida). Mas eu não pintei na mesma página da arte-final original. Usei uma mesa de luz para fazer as cores em outro papel, e depois montei as páginas sobrepostas, no Photoshop.

Estudo de diagramação da webHQ
Estudo de diagramação da webHQ

GG: Qual a parte da HQ que vocês mais gostaram de fazer? E qual deu mais trabalho?

Hector: Adorei a pesquisa histórica como um todo; gosto bastante de ir atrás de referências visuais para os artistas. E de entender melhor o contexto da criação do Dia Internacional da Mulher, que é uma mistura de fatos e momentos sócio-políticos.

Mario: Eu adoro preto e branco, e a arte-final sempre é bem legal de fazer. As cores foram uma experiência muito boa, mas bem difícil, por ter sido feita na mesa de luz. Eu só tinha noção das formas e contornos se a luz estava ligada, e só visualizava as cores corretamente com a luz desligada. Fiquei uns três dias dedicado só a isso. A ideia de usar azul para as cenas frias e contidas da Camella, e amarelo para as cenas agitadas e tensas da greve fez a HQ ganhar uma dimensão muito mais interessante do que se fosse feita só com as cores normais.

Pão e Rosas Estudos Personagens
Estudos de personagens da webHQ

GG: Qual é a expectativa quanto ao retorno do público?

Hector: sinceramente não sei dizer, estou esperando pra ver. Vou ficar contente se mais gente tomar conhecimento de alguns dos fatos que inspiraram essa dramatização. Sei que isso vai soar pretensioso mas, quem sabe, se pelo menos uma mina se inspirar a fazer gibis já vai estar valendo. Precisamos de mais meninas produzindo.

Mario: Eu realmente gostaria que as pessoas refletissem mais sobre seus costumes e crenças, o que lhes é imposto (mesmo que subliminarmente, mesmo que desde crianças) e o que faz ou não sentido atualmente. Vivemos em 2015 e é um absurdo que ainda exista o pensamento machista, que ainda exista homofobia, racismo, que a religião ainda cegue e distorça a visão de mundo… Nossa HQ é uma singela homenagem à luta pelos direitos. Todo mundo merece ser tratado decentemente e com respeito.

GG: Vocês têm mais algum ponto/aspecto que gostariam de destacar?

Hector: “Pão e Rosas” é uma pequena história sobre a luta pelos direitos das mulheres, que sempre ficam na sombra da História, principalmente quando se fala de mudanças sociais. Muito se discute hoje – no meio nerd inclusive – sobre o Feminismo e quais papéis homens e mulheres devem ter nessa questão. As mulheres mais incisivas em suas lutas normalmente são vistas como implicantes, chatas, desequilibradas ou qualquer outra coisa que os homens queiram falar sobre elas. Mas são as mais combativas que abrem caminho para as outras passarem – e pros caras também. Respeitem as minas.

Página de Pão e Rosas sem as cores finais
Página de Pão e Rosas sem as cores finais

Sobre outros projetos

GG: Vocês estarão, cada um com seu trabalho, no FIQ 2015 (Festival Internacional de Quadrinhos, que acontecerá em Belo Horizonte de 11 a 15 de novembro)? Se sim, o que estarão mostrando para o público?

Hector: Sim, adoramos o FIQ! Estarei no estande da Fictícia (com o Pablo e uma galera) levando se tudo der certo as seguintes novidades: “Barão Macaco” uma graphic novel policial em estilo noir moderno, “Mulheromem” (contemplado com o ProaC de 2014), um álbum metalinguístico sobre super-heróis que mistura gêneros em todos os sentidos e “As Aventuras Ocultas de Gouvêa e Sadu”, uma revista sobre um casal de magos dândis nos Anos 20.

barao-macaco-capa-preview

Pablo: Já está certo pro FIQ deste ano o lançamento do segundo volume de “Mayara & Annabelle” com o Talles Rodrigues. Na verdade, a ideia é até lançar antes, pra chegarmos no evento com o álbum bombando.

Mario: Estarei no FIQ com certeza. Tenho um livro, lançado em 2014, chamado “Morphine”. Ainda quero continuar a trabalhar esse título, e tenho ideias para levar coisas novas também. Espero levar mais livros de “Terapia”, também.

Os autores:

Hector Lima – roteiro

Hector Lima

Redator e roteirista. Seus gibis saíram em coletâneas como “Manticore” e MSP Novos 50 (roteiro indicado ao Troféu HQMIX de 2012). Publicou “O Major” (indicado ao HQMIX de 2008), escreveu “A Rainha do Grito” para “Necronauta Vol. 2” (de Danilo Beyruth), e co-roteirizou com Pablo Casado o álbum “Sabor Brasilis” (Zarabatana – indicado a “Melhor Edição Nacional” no HQ Mix 2014). Organizou a coletânea “Inkshot” (MonkeyBrain Comics, 2013) e publicará em 2015 “Barão Macaco” e “Mulheromem” pela Fictícia, selo do qual é co-fundador.

Pablo Casado – letras

Pablo Casado

Nascido e criado em Maceió, Alagoas, é roteirista de quadrinhos e filmes. Integrante do coletivo Fictícia, é co-autor das HQs “Sabor Brasilis” (Zarabatana Books), contemplada pelo ProAC, e de “O Clube dos Monstros dos Bairros Distantes”. Escreveu e editou o primeiro volume de “Mayara & Annabelle”, com arte de Talles Rodrigues. Co-produziu e roteirizou dois curtas por sua produtora, a Muamba Cultural.

Mario Cau

Mario Cau

Sobre o quadrinhista Mario Cau, responsável pela arte de “Pão e Rosas”, vou falar na próxima coluna, quando vou mostrar para vocês a premiada webcomic-que-virou-HQ Terapia.

Compartilhe: