Parece que todo mundo nas redes sociais decidiu dar opiniões sobre os indicados ao Oscar…

Todo mundo está falando sobre o estado geral do cinema… E sobre arte… E sobre o mundo de hoje. E tudo bem, afinal é pra isso que servem os sites como o Twitter, mas às vezes, pessoas acabam expondo opiniões que não são legais, mesmo que você seja uma lenda cultural como Stephen King. E isso prova que até mesmo lendas podem estar erradas às vezes.

O autor resolveu entrar na discussão sobre a falta de diversidade nos Oscars, e em tudo mais. Nós já falamos bastante sobre o quão desapontante é saber que a Academia não parece se importar com as mulheres, com a diversidade entre diretores, e sabe, sobre qualquer coisa relevante para todos nós no mundo em que vivemos. O autor de O Iluminado e A Coisa resolveu levar as coisas para outra direção.

[Como escritor, eu só posso ser nomeado em três categorias: Melhor filme, melhor roteiro adaptado e melhor roteiro original. Para mim, a questão da diversidade – como somente se aplica a atores individuais e diretores, de qualquer forma – não surgiu. Dito isso…]

[… eu nunca levaria em consideração a diversidade quando a arte estiver em questão. Apenas a qualidade. Parece para mim que fazer de outra forma seria errado.]

Então vamos falar sobre o porquê disto estar errado.

Essa fala é o epitomo do privilégio masculino branco. King está acostumado a criar e consumir histórias para e sobre pessoas como ele: hétero, branco, homem e cisgênero. E isso é o privilégio: ter a opção de seguir com sua vida na menor escala de dificuldade até chegar a (muitas vezes correta) ideia de que tudo é sobre e para você.

Não são apenas as histórias de pessoas privilegiadas que recebem mais tempo de tela e atenção, afinal. É o fato de que esses filmes, livros e séries, feitos por e para caras brancos, velhos, heterossexuais, são reconhecidos pela “sociedade” e “cultura” – como demonstrado por instituições como a Academia – como “mais merecedores” e de “qualidade superior” do que as histórias dos grupos marginalizados. É por isso que “qualidade” e “meritocracia” aparecem tanto na linguagem das pessoas privilegiadas:

Elas estão acostumadas não apenas com a arte ser sobre elas, mas também estão confortáveis em uma sociedade que define essas narrativas privilegiadas como o “ápice da boa arte”.

Stephen King tem muita sorte de que ele apenas vê a “qualidade” na arte. Para ele, um homem cuja maior parte da arte que produz é financiada e apoiada, isso é fácil. Não é tão fácil para aqueles que não compartilham de tais privilégios. Nós podemos gostar de filmes que não são feitos para nós – porque, é claro, filmes sobre homens brancos e héteros são a experiência humana padrão (certo?), mas nós lutamos para ser os sujeitos, e até mesmo os autores, não apenas expectadores. Quando nós vemos nossas próprias histórias, aquela arte que pode nos levar além e nos mudar, isso também pode ser uma arte melhor do que aquilo que assumimos ser “qualidade”.

A diversidade faz a arte melhor. Contar histórias únicas, empolgantes e inexploradas é essencial para manter a arte interessante, vital e relevante.

Sim, nós podemos voltar ao mesmo poço de sofrimento branco e masculino e encontrar trabalhos incríveis que possam ser reconhecidos, mas existem tantos outros trabalhos que não podemos ver quando não oferecemos o apoio e buscamos a diversidade na arte.

Nós precisamos incluir a diversidade em nosso julgamento, ou então nunca mudaremos o que é visto como “bom”.

Ao olhar apenas para a “qualidade”, pessoas como King ignoram muita coisa. Elas inconscientemente perpetuam os padrões da sociedade que definem qualidade de uma forma estreita e privilegiada. Stephen King não está sendo racista ou machista ao dizer que não pensa em diversidade ao medir “a qualidade da arte”, mas está reproduzindo e reforçando as construções sociais que mantém as pessoas marginalizadas de fora.

[A coisa mais importante que podemos fazer como artistas e pessoas criativas é ter a certeza de que todos têm as mesmas chances, independente de sexo, cor ou orientação. Agora, essas pessoas estão terrivelmente sub-representadas, e não apenas nas artes.]

Novamente, a ideia de que “todos tenham as mesmas chances” é um ponto de vista privilegiado, porque nem todo mundo pode começar do mesmo ponto.

A sociedade e a cultura estão posicionadas contra o sucesso das pessoas marginalizadas – seja uma mulher, uma pessoa de etnia ou gênero diverso, ou pessoas queer; ou na verdade, qualquer um fora daquele estreitíssimo padrão. Nós raramente vemos nossas histórias sendo contadas, e de forma ainda mais rara, podemos ser nós a contá-las, porque é muito mais fácil para uma pessoa privilegiada conseguir o investimento, atenção, premiações e sucesso.

King está absolutamente certo quando afirma o seguinte:

[Você não pode receber premiações se é forçado para fora do jogo.]

Fazer com que pessoas participem do jogo significa que as pessoas privilegiadas devem ceder espaço, não apenas na mesa, mas em seus pontos de vista sobre o que “vale como arte de qualidade” e que devem incluir isso em seu cálculo.

Se uma obra de arte não inclui sequer uma pitada de diversidade hoje em dia, essa arte está falhando e isso é algo que deve influenciar negativamente sua “qualidade”. A incapacidade de um criador em valorizar pontos de vista e histórias fora de sua própria experiência é uma falha. A perpetuação da violência e angústia masculina, branca e hétero como o epitomo do prestígio é uma falha de criatividade e percepção. E isso é importante.

Tornar o mundo um lugar melhor, com arte melhor que sirva e represente a todas as pessoas que trabalharam nela. Isso exige que todos nós reexaminemos nossos privilégios e preconceitos, e olhemos para a arte não apenas em termos de “qualidade”, mas em como ela alcança o sucesso ou falha em razão de sua diversidade. Apenas com esse olhar duro é que podemos avaliar, premiar e aclamar aqueles que ofereçam as mudanças que precisamos para que “todos tenham uma chance no jogo”.

Stephen King deveria se importar com a diversidade na arte, assim como todos aqueles que votam na Academia deveriam, especialmente os homens brancos privilegiados.

É desconfortável olhar para seus próprios preconceitos e privilégios, mas isso é algo essencial se queremos uma arte melhor e um mundo mais justo no futuro.


Texto traduzido e adaptado do TheMarySue.

Créditos de imagem: Marc Andrew Deley/Getty Images

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