Novamente, desapontadas.
A tag #RIPJKRowling ficou em tendência mundial no Twitter na semana passada, mas a autora está viva e bem. Sua carreira, no entanto, é outra história… O novo livro de Rowling, Troubled Blood (“Sangue Inquieto” em tradução livre), supostamente apresenta um estereótipo transfóbico perigoso e, novamente, os fãs estão desapontados, para dizer o mínimo. A primeira resenha do quinto livro da série Cormoran Strike foi palco para notícias de que o livro, lançado em 15 de setembro, inclui um assassino em série, cisgênero, que se vestiu de mulher para matar sua vítima. Algumas livrarias inclusive optaram por boicotar o lançamento.
Desde que a autora postou uma série de tweets e um longo ensaio em junho sobre sua preocupação com o “novo ativismo trans”, que incluía a perpetuação do mito de que os direitos dos transgêneros abririam as portas para crimes contra as mulheres, a situação se torna cada vez mais agravante. Agora, apesar de muitas pessoas tentarem dizer o contrário, parece que Rowling dobrou o problema e a visão de que ela realmente é transfóbica. Como a crítica do The Telegraph observa, a moral de Troubled Blood parece ser: “nunca confie em um homem em um vestido”. A análise imediatamente gerou protestos de membros da comunidade LGBTQI+ e aliados no Twitter, com alguns usuários apontando que não apenas o estereótipo supostamente usado no livro é perigoso, mas que também é recorrente, como em Buffalo Bill em O Silêncio dos Inocentes, Norman Bates em Psicose.
She's channeling psycho and silence of the lambs for one of media's most harmful transphobic tropes—which also dovetails with TERF bathroom talking points.
this is the equivalent of a major children's novelist writing a book promoting antisemitic blood libel, imo. https://t.co/E8a1HZlmqM
— Noah Berlatsky (@nberlat) September 14, 2020
Trad.: [Ela está canalizando Psicose e Silêncio dos Inocentes para usar um dos tropos transfóbicos mais prejudiciais da mídia – que também se encaixa nos pontos de discussão sobre TERFs. Isso é o equivalente a um grande romancista infantil escrevendo um livro promovendo libelo de sangue anti-semita, na minha opinião.]
i am absolutely DISGUSTED by JKR and Hachette. i am filled with rage and hate. she is pushing narratives that get trans folks discriminated against, brutalized and murdered.
this is an aggressive act of violence against the trans community.
— Aiden Thomas ???????? CEMETERY BOYS on sale now! (@aidenschmaiden) September 14, 2020
Trad.: [Estou absolutamente ENOJADO com a JKR e a Hachette. Estou com muita raiva e ódio. Ela está promovendo narrativas que fazem com que pessoas trans sejam discriminadas, brutalizadas e assassinadas. Este é um ato agressivo de violência contra a comunidade trans.]
So the wizard school lady’s new book and relentless transphobic rhetoric is awful, hurtful, and dangerous — especially given her very large platform.
As I’ve said before, f all that transphobic nonsense.
Sending my love and support to all my twitter trans and nonbinary folks.
— Gennifer Hutchison (@GennHutchison) September 14, 2020
Trad.: [Então, o novo livro da senhora da escola de bruxos e a retórica transfóbica implacável são horríveis, dolorosos e perigosos – especialmente devido à sua plataforma ser muito grande. Como eu disse antes, foda-se todo aquele absurdo transfóbico. Mandando meu amor e apoio a todas as pessoas trans e não binárias do Twitter.]
In Harry Potter terms, JK Rowling has become Cornelius Fudge, unwilling to believe she’s been wrong all this time and doubling down on her transphobia. pic.twitter.com/vwQohwMErD
— Washington Post TikTok Guy ???? (@davejorgenson) September 14, 2020
Trad.: [Em termos de Harry Potter, JK Rowling se tornou Cornelius Fudge, não querendo acreditar que ela estava errada todo esse tempo e dobrando em sua transfobia.]
Infelizmente, o personagem relatado em Troubled Blood não é a primeira instância de Rowling promovendo estereótipos transfóbicos na série Cormoran Strike. Conforme apontado pelo site Pink News, o segundo livro da série, The Silkworm, inclui um personagem transgênero que é descrito como “instável e agressivo”. A personagem também tem seu nome morto (nome antes da transição) revelado e é avisada por Strike que a prisão “não será divertida para você… Não pré-operatório”.
Rowling tem insistido que ela não é transfóbica muitas vezes, especialmente desde seus tweets explosivos sobre essas questões. Em 6 de junho, Rowling postou uma série de tweets revelando sua posição sobre a definição de sexo e gênero. “Se o sexo não for real, não há atração pelo mesmo sexo”, escreveu ela. “Se o sexo não for real, a realidade vivida pelas mulheres em todo o mundo é apagada. Eu conheço e amo as pessoas trans, mas apagar o conceito de sexo remove a capacidade de muitos de discutir suas vidas de forma significativa. Não é ódio falar a verdade”.
The idea that women like me, who’ve been empathetic to trans people for decades, feeling kinship because they’re vulnerable in the same way as women – ie, to male violence – ‘hate’ trans people because they think sex is real and has lived consequences – is a nonsense.
— J.K. Rowling (@jk_rowling) June 6, 2020
A autora chegou recentemente ao ponto de devolver um prêmio de direitos humanos concedido a ela pela organização de direitos humanos Robert F. Kennedy depois que Kerry Kennedy publicou uma declaração denunciando e repudiando suas opiniões. Para a Variety, Kerry escreveu que falou com Rowling, “para expressar sua profunda decepção por ela ter escolhido usar seus dons notáveis para criar uma narrativa que diminui a identidade de pessoas trans e não binárias, minando a validade e integridade de toda a comunidade transgênero”.
Rowling respondeu em seu site escrevendo que: “a declaração implicava incorretamente que eu era transfóbica e que sou responsável por prejudicar as pessoas trans. Como uma doadora de longa data para instituições de caridade LGBT e defensora do direito das pessoas trans de viverem livres de perseguição, Eu absolutamente refuto a acusação de que odeio pessoas trans ou desejo-lhes mal”.
Apesar da afirmação de Rowling de que suas declarações não prejudicaram os membros da comunidade trans, os fãs transgêneros da série Harry Potter falaram sobre o quão desmoralizantes os comentários da autora foram. Mais recentemente, Cynthia Nixon, estrela de Sex and the City, compartilhou com o The Independent como os comentários de Rowling afetaram seu filho transgênero Samuel. Vale a pena ler pra entender a fundo, mas citamos uma parte que é muito importante:
Foi muito doloroso para ele porque grande parte de sua infância foi ligada a Harry Potter”, disse Nixon. “Somos uma família Harry Potter. Os livros parecem ser sobre defender pessoas que são diferentes, então ela selecionar esse grupo de pessoas que são obviamente diferentes e meio que negam sua existência, é simplesmente … é realmente desconcertante.
É uma pena que a autora use sua gigante plataforma para espalhar ignorância e preconceito, coisas que sua maior obra parecia combater tanto.
Fonte: Bustle
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Débora é musicista, professora de artes, pesquisadora de sociologia de gênero. Autoproclamada otaku-não-fedida e gamer casual. A alcunha de Liao veio de um site aleatório de geração de nomes japoneses (Liao é chinês, mas tudo bem).